sexta-feira, 9 de março de 2012

Sobre o fantasma do "E SE..." - por Danielle




O nome daquilo era medo. Aquele mesmo que sentiu quando caiu do balanço no parquinho pela primeira vez quando ainda criança. Todo domingo de sol acordava ansioso para ir ao parque, encontrar os amigos, alçar vôos cada vez maiores no seu balanço preferido. Cada nova vez no brinquedo queria extrapolar todos os limites e ir cada vez mais alto. Até que um dia ele caiu do balanço. Até que num lindo e ensolarado domingo no parque, as mãos ficaram frágeis demais e ele caiu do balanço. E a partir desse trágico dia, tudo em sua vida girava em torno de um letreiro luminoso gigantesco que piscava intermitentemente: “E SE…”.

Era tanta dúvida, tantas vírgulas, reticências e interrogações que era impedido de dar dois passos adiante sem que ficasse estagnado dois passos atrás. E se der errado, e se acontecer de novo, e se doer, se ferir, se machucar, e se for em vão e se não for. Eram muitos “se”, eram muitas possibilidades ou impossibilidades numa frase só. Era uma gramática inteira de pontuações empregadas da maneira errada num romance que mais parecia um conto breve. A gente acorda, dá um beijo no namorado (a), toma banho, faz o café, trabalha, dança, volta pra casa, faz a janta, beija o namorado, assistem TV até pegarem no sono, dorme e no outro dia começa tudo outra vez. Mas a verdade é que ninguém sabe como vai ser o dia de amanhã. De forma que, o único “se” perdoável é aquele que te permite viver intensamente o agora, o hoje. E se não houver o dia de amanhã?

Nunca mais subiu num balanço na vida. A adrenalina gerada pela simples entrada no parque era tão grande, que só a aproximação do brinquedo o fazia relembrar da queda. E se afastava. Sabia que podia ser seguro novamente, mas o temor da possibilidade criava uma barreira enorme entre o menino e o balanço. Perdeu risos, o ar puro de quando chegava ao ápice de seu vôo, perdeu os cabelos soltos ao vento, o sol iluminando a face quando chegava ao ponto mais baixo da trajetória, perdeu requintes de felicidade que não voltariam mais.

A verdade é que tem certas coisas na vida que a gente só descobre o rumo delas, entrando no caminho, ou seja, tentando. A gente deixa de tomar atitudes, transfere comportamentos, arruma desculpas pra problemas que seriam facilmente resolvidos com uma palavra que abre portas: “sim”. Sim, eu me permito tentar. A possibilidade de cair do balanço sempre existe, mas não me parece justo desistir de um desejo, de um sonho, por puro medo. Tirar o pé do chão às vezes dá um certo receio, uma insegurança acerca do tamanho da queda se o pé não repisar na hora certa. Mas até pra andar e ir adiante, a gente precisa sair um pouco do chão seguro. É preciso coragem. Cair não fere ninguém. Pode doer, deixar um ou dois arranhões, mas com o tempo isso passa, o que fere de verdade é a cicatriz que não te deixa esquecer do que passou.

Já dizia uma sábia amiga minha: O “não” você já tem, busca o “sim”. Porque a gente não precisa que todos os passeios no balanço da vida dêem certo, a gente precisa que funcione só uma vez, uma “vezinha” só, e já vai ser  válido, já vai ser eterno. Todo dia é dia de recomeçar, de dar uma chance ao sim. SE vai dar errado, não dá pra prever. Porque se der errado você pode amaldiçoar o mundo inteiro, mais vai dormir com a cabeça tranquila no travesseiro que você fez o que estava ao seu alcance fazer. Em compensação, se funcionar, o universo garante nada menos do que a felicidade, cabelos soltos novamente ao vento e uma infinidade de pontuações gramaticais que não refletem em nada o peso de uma vírgula ou uma reticência.

O menino temia o balanço. Ficava ali sentado perante seu brinquedo favorito sem conseguir brincar. Enquanto todos a sua volta enfrentavam seus medos e receios, enquanto todos se divertiam no ali e no agora, sem pensar no amanhã, ele só conseguia observar, lamentar e calar. Sozinho.

Um dia ele vai envelhecer, assim como todos nós, e tudo que vai restar a ele são os “se”, os mesmos de quando era jovem. A diferença é que quando a maturidade ensinar a ele que tempo não se compra, não se vende, mas sim se divide, o parque, os sorrisos, o vento no rosto, o balanço, o tão almejado balanço pode não existir mais. Uma oportunidade perdida, é um segundo que poderia ter feito a diferença pro resto da sua vida. “E se” esse minuto voltar, não vai ter a mesma força, o mesmo ímpeto, o mesmo querer. Por isso antes de desistir da brincadeira, de abandonar o balanço, o parque, as flores…não se perca. Não perca o minuto, não perca o balanço.

E se só dessa vez, for diferente?




----texto por Danielle Daian (colunista CasalSemVergonha)----


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